Júlia, a filha da Lica - Vidas dos nossos jovens importam!

Por Kitty Paranaguá

"Vidas nas favelas importam" (#vidasnasfavelasimportam) é um movimento que foi criado e no dia 28 de junho fizeram uma manifestação na Cinelândia, convocando a população a olhar para isto. Estão matando os nossos jovens. Existe uma violência no Rio de Janeiro hoje, que tira o nosso fôlego.

Temos que nos engajar nesta luta e zelar pela vida desta população jovem que vem sendo assassinada todo dia. Os tiros nas favelas precisam ser ouvidos por todos nós. As vidas nas favelas importam a todos!

Hoje quero falar de uma jovem em especial, que também perdeu seu direito de viver.

As Filhas da Lica. Série Campos de Altitude, 2016. Foto: Kitty Paranaguá.

As Filhas da Lica. Série Campos de Altitude, 2016. Foto: Kitty Paranaguá.

Júlia Ferreira Rodrigues, a menina do meio da  foto "As Filhas da Lica", da série Campos de Altitude. Conheci  este trio alegre e cheio de vida  dançando na porta do metrô em Ipanema, enquanto esperávamos o elevador do Cantagalo voltar a funcionar.  Naquele  momento estava parado por causa do tiroteio lá em cima.  Apesar do tiroteio, que já faz parte da rotina delas, elas dançavam.  Ensaiavam uma dança para a festa de 15 anos que iam fazer juntas.  Pena que esta alegria durou tão pouco  e estes encontros não serão mais possíveis. 

Júlia morava no Cantagalo, mas tinha se mudado  para Nova Iguaçu com sua família. Lica, sua mãe achou que seria um lugar com menos violência para criar seus filhos. Ela se enganou. No dia 9 de abril, há exatamente 3 meses, Júlia saiu de casa com 3 amigos para ir a uma festa e nunca mais voltou. Estava no lugar errado. Alguém no carro deveria estar marcado para morrer e os 4 foram chacinados.

Para sua família e seus amigos, restaram as lembranças daquela menina alegre, estudiosa e de bem com a vida. Agora Lica mata as saudades vendo as fotos da  sua última festa. Sua filha tinha feito dezessete anos em fevereiro e comemorou com os amigos. Elas não sabiam que seria seu último aniversário.

Júlia, triste é saber que a sua morte não muda nada nesta cidade em que estamos morando, reféns de um lugar que está nos sufocando, onde nos tiraram até o direito de morrer naturalmente. Agora é assim: as pessoas acham que podem dar fim às vidas dos outros ao seu bel prazer. Este é o legado que nos deixaram: uma cidade sem sol e sem lei.

Quando será que vamos conseguir virar este jogo?

No dia da abertura da exposição Campos de Altitude, FotoRio 2017, na Justiça Federal, Júlia  foi com a sua irmã Maria e sua mãe Lica ver a sua foto exposta. Foto: Kitty Paranaguá.

No dia da abertura da exposição Campos de Altitude, FotoRio 2017, na Justiça Federal, Júlia  foi com a sua irmã Maria e sua mãe Lica ver a sua foto exposta. Foto: Kitty Paranaguá.

Passeata #vidanasfavelasimportam. Foto de Ana Carolina Fernandes.

Passeata #vidanasfavelasimportam. Foto de Ana Carolina Fernandes.


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Kitty Paranaguá é formada em Jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e pós-graduada no curso Fotografia: imagem, memória e comunicação pela UCAM – RJ. Iniciou sua carreira como repórter fotográfica no Jornal do Brasil, onde trabalhou por quatro  anos. Tem trabalhos na coleção Joaquim Paiva e Thomas Kellner. Em 2011, publicou o livro Copacabana  pela editora Barléu. Com participação em diversos livros e exposições, é uma das fundadores do Ateliê Oriente.

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