Glória, Lucas e um adeus à Regina

Quando Regina apareceu para a primeira aula ficou claro que ali estava alguém que tinha muitas certezas e algumas dúvidas. As certezas não lhe faziam ter qualquer tipo de atitude que lembrasse, nem de longe, arrogância. Muito pelo contrário, eram só certezas, coisa íntima, privada, nada que se deva ficar ostentando como palavras cintilantes de um oráculo. As dúvidas, bom, as dúvidas eram o que moviam a sua força criativa, que a faziam olhar para as coisas comuns e ordinárias como se fossem potências imagéticas. Pelo olhar escrutinador de Regina tudo virava aparição. Não eram mais coisas habitantes do mundo, mas vistas que tinham uma existência para além da imagem. Entes com vontades. E foi assim que Regina assistiu e registrou o desmonte do Hotel Glória e parte do outeiro homônimo. Da janela de sua casa fotografou as cicatrizes abertas diariamente no morro atrás do seu apartamento e viu beleza no que ruía. O belo era certo, o destino dúvida.

Este processo se repetiu com as imagens que Regina preparou para Lucas, sua derradeira exposição. Internada no Hospital São Lucas para tratar do câncer que acabou por lhe ceifar a vida prematuramente, Regina olhou para o ambiente inóspito que lhe rodeou por tantos dias sem sofrimento ou sofreguidão. Calmamente construiu as suas imagens, tão pessoais quanto doces, de forma a deixar um legado que mostra que os seus olhos viam com muitas certezas e nenhuma dúvida.

Glória se estende por Lucas e os dois pertencem para sempre à Regina. O que ela viu e nos mostrou não ficará velho nem morrerá, pois agora também nos pertencem.

Escrito por Paulo Marcos, professor de Regina no GIF | Grupo Interessado em Fotografia

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A missa de sétimo dia de Regina Cabral de Mello será no dia 10 de abril, às 10h na Igreja Nossa Senhora da Paz.

 

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